Em tempos escrevi aqui no blog sobre o sindroma da folha branca... aquele momento de terror e expectância de quem vai lutar, na fase inicial, com a folha imaculada e vai preenchê-la de ideias que se vão enfentar, desenvolver, gerar à medida que o discurso escrito se propaga no preto da escrita. Algo de planeado e estruturado (muitas vezes muito e outras pouco) ou outras a aparecer a cada penada ao contacto com o suporte sólido, e a palavra e a frase construída arrasta outra palavras e mais uma frase que vão discorrendo de modo intenso ou inócuo, agradando ou não ao criador do texto...
Mas agora e neste momento, que será passado em breve, talvez sem futuro, quero escrever (depois de ter passado o terror do branco ou do écran nú), sem brancas na memória, sobre ideias e estupefacção que sempre me ocorre quando leio o que está escrito. Nada a ver com conteúdos ou pensamentos, mas sim com as letras, as palavras, as frases... os parágrafos, as entrelinhas, os rodapés...
O que quero falar (escrever) é sobre algo que não falamos em geral, porque é para nós demasiadamente óbvio e mecânico... a conversão de letras, de símbolos em ideias, que pomos no papel, e interiorizamos e transmitimos a outros e/ou absorvemos de outros, usando códigos maravilhosos. Sim, maravilhosos... como nos organiza(á)mos em alfabetos, letras, símbolos, que per si nada valem, mas quando em conjunto estão ligados a uma imagem, a uma ideia... e desencadeam toda uma parafrenália de informações e sentimentos.
Amor, Dor, Rio, Pai, Ódio, Mar, Cão, Mel, Sol.. olhem bem... reflitam... poucas letras... e separadas nada valem mas, em conjunto, um mundo de imagens, relacionamentos, pensamentos, correlações, emoções, sensações, sentimos frio e quente, doce e amargo, ternura, paixão, solidão... e são apenas letras que se juntam... e tudo isto para dizer o quê?... que vale a pena parar, refletir, pensar em nós como seres previlegiados e pensantes... mas que se pararmos um pouco e pensarmos, com toda a humildade e alguma ingenuidade e espírito aberto, e olharmos para a folha branca, com sinais, letras, hieróglifos, caractéres, números, redescobrimos que a mente, uma máquina extraordinária, junta e revela códigos, códices, abstrações... em suma, concretiza e transmite ideias....e são impulsos, transmissão de sinais eléctricos e magnéticos... e são reacções de reconhecimento molecular, cascatas de reacções químicas... e são tanta coisa que não sabemos e gostariamos de desbravar e de compreender.
Termos capacidade de analizar o óbvio, o complexo, enfrentar o fantástico e ficarmos pasmados, naquela atitude de que nada sei, e muito tenho que aprender... é algo único. É mesmo muito bom, quando de vez em quando paramos e ainda nos deslumbramos pelo desconhecido.
E há tanta coisa à nossa volta que parece óbvio e que o não é... basta abrir os olhos!
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